10.12.11

Selvageria, volúpia e desejo



Selvageria, volú­pia e desejo sem limite é a prin­ci­pal marca da obra prima do dire­tor Rainer Fassbinder


O que pas­sava na cabeça de Rainer Werner Fassbinder quando fil­mou Querelle, o romance exis­ten­ci­a­lista e expli­ci­ta­mente homo­e­ró­tico de Jean Genet? Provavelmente, um misto incóg­nita de pai­xão e ódio cujo resul­tado artís­tico é ine­gá­vel, prin­ci­pal­mente na foto­gra­fia e nos figu­ri­nos de Bárbara Baum e Egon Strasser que, mais tarde, ser­vi­ram de ins­pi­ra­ção para Gaultier for­ma­tar uma de suas cole­ções mais famo­sas. O filme encarna, a cada cena, um conto de vio­lên­cia, pai­xão e intensa sub­mis­são sexual em cená­rios esti­li­za­dos e pro­po­si­ta­da­mente arti­fi­ci­ais do porto de Brest. Tudo com tor­res em forma de pênis e outros sím­bo­los pra lá de fálicos.


Lançado em 1982, depois da morte de seu dire­tor, Querelle é um filme deli­ci­o­sa­mente peri­goso. Nele não há pra­zer, mas ape­nas um tipo de deses­pero sufo­cante que faz o espec­ta­dor se asfi­xiar no inte­rior de cená­rios que apri­si­o­nam o olhar e o senso em obses­si­vos tons de ama­relo e laranja que res­sal­tam o calor e o ocaso de uma vida que, se repleta de volú­pia, cami­nha rumo à aci­dez da auto­des­trui­ção. Lá, a razão é feita, exclu­si­va­mente, de sofri­mento. E o pró­prio sado-masoquismo assim deve ser. Sempre repleto de uma beleza arre­ba­ta­dora, mas que é con­tra­di­to­ri­a­mente feia, que beira o des­gosto e é reche­ado de amor.

O mari­nheiro Querelle é puro desejo de for­ni­ca­ção que se expressa na típica sel­va­ge­ria do sexo masculino.O enredo conta um pequeno tre­cho da vida de um mari­nheiro amo­ral cuja sen­su­a­li­dade é ofe­re­cida para a admi­ra­ção e gozo de todos. Depois de matar o com­pa­nheiro, ele se refu­gia num sór­dido bor­del à beira-mar onde começa por des­co­brir sua homos­se­xu­a­li­dade. Em outro ponto está Franco Nero, o coman­dante que sucumbe à seu charme boê­mio e mas­cu­lino. Noutro está Jeanne Moreau, uma can­tora reco­berta por um gla­mour des­pre­zí­vel, e que tam­bém o deseja. E nessa tor­rente de desejo não há o menor natu­ra­lismo. Toda pala­vra, toda cena, cada gesto é estu­dado, arti­fi­cial, até mesmo a pró­pria abor­da­gem do homo­se­xu­a­li­dade par­tir do texto de Genet. O pró­prio foi um per­so­na­gem e tanto. Delinqüente, ladrão, pre­si­diá­rio, gay, aca­bou sendo res­ga­tado por Sartre e Cocteau, que des­co­bri­ram seu gênio e obri­ga­ram a França con­ser­va­dora a encará-lo, ante­ci­pando pro­cesso seme­lhante ao que ocor­re­ria na Itália com Pier-Paolo Pasolini. Genet não que­ria com­pre­en­são para os homos­se­xu­ais, não que­ria inte­gra­ção social.


Quem faz Querelle é o ator Brad Davis, que havia feito Expresso da Meia-Noite, de Alan Parker, em 1978 (com roteiro ven­ce­dor do Oscar de Oliver Stone). No Expresso, Davis faz o jovem ame­ri­cano que conhece o inferno numa pri­são na Turquia, para onde é levado, por porte de haxixe. Uma esta­ção no inferno – homos­se­xu­a­lismo, vio­lên­cia, tor­tura. O inferno con­ti­nua em Querelle, mas agora é interno (ape­sar da vio­lên­cia externa). A homo­se­xu­a­li­dade é ampla­mente sel­va­gem, mar­gi­nal. E nessa pers­pec­tiva pode­ría­mos dizer que Querelle é Genet e o pró­prio Fassbinder já que os três trans­gri­dem a si mesmo, são reféns da pró­pria persona.


Uma das fra­ses, “Todo homem mata aquilo que ama”, pon­tua a sub­ver­são em Querelle. Há um crime, que acaba por envol­ver várias pes­soas, as que desem­bar­cam no porto e as que vivem ali. Quem mor­reu? Quem de fato matou? O que Querelle tem com toda essa his­tó­ria? Fica no ar. Toda a ordem se per­verte de uma forma encan­ta­dora e fica difí­cil obser­var o per­so­na­gem com olhos que não sejam os da von­tade de fodê-lo várias vezes, sem a menor com­pai­xão, em todas as posi­ções possíveis.



QUERELLE - Rainer Werner FassbinderAlemanha/França, 1982
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1 comentário:

helô disse...

o filme tá em inglês. se alguém achar a legenda pro português, coloca no roda, pf =)

1 Comentários
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­Ss##########


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