6.6.12

Manifesto – Marcha das Vadias em Maringá (PR)

A marcha das Vadias nasceu em resposta ao depoimento de um policial na Universidade de Toronto, sobre segurança no campo universitário. Em sua fala infeliz, o policial defendia que para se defender de estupros as mulheres não deveriam se vestir como "vadias" (sluts). Como se a culpa da violência fosse da vítima, causando grandes mobilizações pelo mundo contra esse os estereótipos das vítimas de preconceito. A Marcha das Vadias chegou ao Brasil e foi realizada em diversos estados e cidades, como em Curitiba (2011) e recentemente em Londrina.
A palavra vadia não soa de forma bonita, pois não é intenção da Marcha utilizar-se de eufemismos baratos, mas sim polemizar! Manter o nome é apoiar a causa. Assim como a violência que ocorre devido o machismo não é um assunto agradável aos ouvidos e aos nossos corpos.

Por que marchamos no Brasil?

Marchamos porque o nosso país ocupa, vergonhosamente, o 7 º lugar em homicídio de mulheres; porque a cada 15 segundos uma mulher é agredida em algum canto do país; porque três a cada dez mulheres já foram agredidas; porque nos últimos 30 anos, mais de 91 mil mulheres foram assassinadas!

E por que marchamos em Maringá?

Nossa cidade é conhecida como “cidade modelo”, cidade sem pobreza (favela), sem violência. Quando a mídia nos reforça a pergunta “mas por que em Maringá”, questionamos: por que NÃO em Maringá? Será que aqui não tem violência de gênero, doméstica, sexual, moral, etc? Aqui não há machismo?

Maringá não está em uma bolha e isenta de todos os problemas que assolam o mundo. A luta de classes, a exploração e a opressão estão presentes em qualquer ponto do globo. Mas em nossa cidade, que tenta transparecer uma perfeição hipócrita, o que acontece é a ocultação de casos na qual nós, mulheres, somos vítimas cotidianas.

Como podemos esquecer-nos da menina Márcia, estuprada e morta por um criminoso com nome de Natanael Búfalo? Como podemos fechar os olhos aos constantes casos de estupro e agressões que aparecem na televisão e são tratados de forma tão leviana?

Sabemos que neste momento há um homem em Maringá a qual já fez sete vítimas mulheres, todas prostitutas. Por que isso não é divulgado? De certo, o ideal é esconder os cadáveres do que assumir que Maringá, a cidade com o maior símbolo religioso da América Latina (Catedral) tenha tantas prostitutas para já terem sido mortas SETE e nada tenha sido feito ou dito até agora.

Por isso nós, mulheres de Maringá e região, marchamos!

Para que sejamos todas e todos respeitadas (os) sempre. Pela penalização e extermínio de todos os tipos de violência seja ela física, institucional, moral, psicológica, sexual, doméstica, por negligência e de gênero. Porque toda e qualquer violência é por si só ilegítima.

Marchamos por políticas públicas e leis efetivas, pela igualdade material no plano da realidade cotidiana. Nós, maringaenses, possuímos uma delegacia especializada, uma Vara especializada, e até mesmo uma secretaria para Políticas Públicas voltadas à Mulher. Mas onde estão os dados das violências sofridas?

Marcharmos pela Transparência dos atos públicos e de interesse da comunidade; contra toda a corrupção que inviabiliza o acesso a direitos fundamentais, como educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, o acesso a informação, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma do art. 6 da nossa Constituição. Porque somos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza!

Marchamos para que as denúncias de violência possam ser feitas com respaldo psicológico às vítimas e preparo dos agentes que as atendem, para que não haja humilhação e sofrimento às mulheres ao denunciar.

Marchamos para que seja feito registros nos órgãos de saúde das lesões corporais sofridas e suas causas, pelo acompanhamento da vítima.

Marchamos pelo direito ao aborto legal e seguro, pois em período de 4 meses (2010), 72 mulheres maringaenses foram internadas no SUS por complicações de aborto; em todo o Paraná, esse número sobe para 9.241! Aborto legal e seguro é uma questão de saúde pública.

Para a conscientização da necessidade de se proteger das DSTs, a viabilização desta proteção e tratamentos disponíveis no SUS, sem tem que ser violada (o), humilhada (o) para ter acesso ao tratamento.

Marchamos contra o racismo, que inferioriza o ser humano pela cor de sua pele! Na nossa cidade, que possui quase 71% de sua população na cor branca, as mulheres negras e mulatas, além da opressão de gênero, sofrem a opressão étnica, possuem menores salários, as piores condições de trabalho, precárias condições de acesso a saúde.

Marchamos por um sistema de cotas também raciais na Universidade Estadual de Maringá, já que as cotas sociais não incluem a população negra e pobre no Ensino Superior.

Para que as Universitárias Mães tenham direito a vagas na creche dentro do campus da Universidade Estadual de Maringá, e demais instituições de ensino superior, onde possam deixar seus filhos e filhas em segurança enquanto dão continuidade aos seus estudos.

Pelo fim da negligência com as indígenas, mulheres que há mais de quinhentos anos sofrem agressões e estupros como arma do genocídio social e cultural de nossos povos.

Marcharmos em nome das mulheres idosas, que tem seu estatuto baseado no das crianças e adolescentes, idosos não são crianças e não são incapazes. Merecem atenção especial do Estado para garantir que estas não sejam exploradas, maltratadas, como todos os direitos que garantam qualidade de vida. Para que viúvas possam voltar a ter relacionamentos afetivos o quanto desejarem sem serem julgadas por isso.

Marchamos contra o tráfico e exploração sexual de mulheres e homens, meninos e meninas. Pelas crianças, contra a pedofilia, pela priorização de uma educação descente, com acesso a cultura.

Marchamos pela igualdade de salários entre mulheres e homens, por credibilidade em cargos de chefia às mulheres.

Para que o trabalho Do Lar seja reconhecido e valorizado como os demais trabalhos braçais, pelo respeito e direitos trabalhistas a estas mulheres.

E que o trabalho doméstico dentro de casa não seja somente uma obrigação feminina! Que haja justa divisão das tarefas domiciliares nas famílias onde ambos trabalham, e não a dupla jornada (super exploração) da mulher!

Marchamos para que a responsabilidade da criação das crianças seja tanto da mãe quanto do pai, com participações equivalentes.

Marchamos em defesa das mães solteiras, das mulheres que criaram seus filhos e filhas sozinhas, das mulheres divorciadas que sofrem de preconceito de diversos tipos.

Por relações livres! Sejam monogâmicas ou poligâmicas, fora da lógica da propriedade privada do outro, pelo respeito às relações das mais diversas crenças e religiões.

Pelo respeito e seriedade no tratamento à violência contra as prostitutas, maiores vítimas da exploração capitalista do corpo e da opressão machista; pela não ocultação dos casos de violência e homicídios de prostitutas (mulheres, travestis, transexuais).

Marchamos contra estereótipos em geral e contra os estereótipos do sexo; onde você deve se enquadrar em homem ou mulher, excluindo e marginalizando travestis, transexuais, transgêneros, gays, lésbicas e bissexuais; ou excluindo do direito de constituir família, e de expor carícias em público.

Marchamos contra a heteronormatividade!

Pela liberdade das mulheres em expressar e exercer sua sexualidade sem serem julgadas como provocantes, “fáceis”, vulgares. Porque as que fazem sexo sem a proteção do sagrado laço do matrimônio estão contra a lei de Deus; porque loiras são motivo de piadas, taxadas como burras; roupas ousadas não são sinônimas de convite ao sexo! Simpatia e gentileza não são sinônimas de “estou de dando mole”; ter a mente aberta não significa ser libertina.

Marchamos por utilizarem nossa imagem na mídia como mero objeto sexual! Nossos corpos não são mercadoria!

Porque homens são cobrados a todo instante a provar sua masculinidade, não podem chorar, nem demonstrar carinho por pessoas do mesmo sexo, obrigados a gostar de esportes, possuir uma boa carreira, jamais serem sustentados pela esposa, são obrigados a se alistarem ao serviço militar, pouca visibilidade a sua saúde como se não ficassem doentes, pois são taxados como os seres “fortes”. Pela igualdade de gênero!

Marcharmos, enfim, contra o machismo, reproduzido em atitudes preconceituosas a todo instante, enraizadas no útero da sociedade, assim como a mulher não gosta do papel de submissa, certamente o homem não deveria gostar do papel de opressor.

Marcharmos para que o feminismo não seja confundido com sexismo, não há gênero superior, não é vingança, não há “machismo ao contrário”. É a tomada de consciência da posição de subordinação de gênero, uma luta por direitos básicos e respeito a todas e todos.

Marchamos, pois a marcha das vadias é um instrumento a serviço da transformação do mundo e da emancipação do gênero humano. Lutamos para que todo tipo de discriminação seja extinta junto aos antigos conceitos decretados à mulher.

Afinal “o pessoal é político” (Carol Hanisch), e tanto os conceitos e as práticas morais como as sociais continuam cúmplices do machismo. O movimento não é só da mulher; em toda a sociedade nada ocorre isoladamente, a história acontece em conjunto, movimentos sociais estão interligados. E a emancipação da mulher, só ocorrerá com a superação do sistema capitalista, com a libertação do gênero humano, quando todos estiverem livres dos padrões e dos patrões, e ter como escolher para si o que lhe for melhor.

Se ser LIVRE é ser vadia, somos TODAS vadias.

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